Introdução
A esperança é um conceito multifacetado que permeia diversas tradições religiosas e filosóficas. No contexto do Antigo Testamento e do Judaísmo pré-cristão, a esperança não é apenas uma expectativa vaga, mas está profundamente enraizada nas promessas divinas, alianças e nas narrativas históricas que moldaram a fé e a identidade do povo de Israel. Este artigo explora as terminologias e conceitos relacionados à esperança na Bíblia Hebraica, destacando como esses termos refletem uma confiança robusta na imortalidade e nas promessas de Deus.
Terminologia e conceitos relacionados à Esperança
As palavras gregas associadas à esperança, paciência e confiança no Novo Testamento (ἔλπίς, ὑπομονή, προσδοκία, πίστις) encontram correspondência nos seguintes termos da Bíblia Hebraica:
- קָוָה (qawāh): Estender-se, esperar (C. Westermann, TheolHdWbAT 2, 619-629)
- יָחַל (yaḥāl): Aguardar, perseverar (Ch. Barth, ThWbAT 3, 603-610)
- חָכָה (ḥāḥāh): Esperar, ter paciência (ibid. 2, 915-920)
- בָּטַח (bāṭaḥ): Sentir-se seguro, despreocupado (A. Jepsen, ThWbAT 1, 608-615)
- אָמַן (’āmān): Confiar, acreditar firmemente (A. Jepsen, ThWbAT 1, 313-348)
- חָסָה (ḥāśāh): Buscar refúgio (J. Gamberoni, ThWbAT 3, 71-83)
Essas raízes são amplamente utilizadas nos Salmos e nos textos proféticos que seguem o estilo linguístico dos Salmos, como em passagens que combinam múltiplas expressões de confiança e esperança (Salmo 27 [26], 13-14; Salmo 62 [61], 6-9; Salmo 130 [129], 5-7; Lamentações 3, 19-30).
As tradições históricas
Os primeiros livros históricos da Bíblia Hebraica empregam raramente o vocabulário relacionado à esperança e confiança. Contudo, as narrativas incluídas nesses textos frequentemente apontam para bênçãos divinas, promessas e alianças, que refletem uma expectativa futura e uma confiança no poder de um Deus fiel.
Essa característica é evidente nas tradições reunidas pelo Javista no período pós-salomônico em Judá e nas tradições parcialmente integradas do Eloísta, oriundas do reino do norte. Exemplos notáveis incluem:
- Gênesis 8, 21: Promessa de aliviar o fardo do pecado sobre a terra, comparado com Gênesis 3, 17 e Gênesis 5, 29
- Gênesis 12, 2: Promessa de descendência e um grande nome a Abraão
- Gênesis 28, 10-28: Promessa de terra, descendência e proteção constante a Jacó
- Números 23, 4-25: Os oráculos de Balaão
- Êxodo 3, 13-14: Revelação do nome de Deus e promessa de fidelidade eterna
Durante o exílio, a tradição sacerdotal apropriou-se dessas antigas tradições de bênçãos, reformulando-as em uma história abrangente desde a criação até o início do culto no Tabernáculo. Essa perspectiva enfatizava a esperança nas promessas divinas e apontava para a restauração futura após o exílio (Gênesis 2, 3; Êxodo 31, 16-17; Gênesis 9, 1-19; Gênesis 17; Êxodo 6, 2-8).
A historiografia deuteronomista, abrangendo o período de Moisés até o exílio, adotou uma abordagem profética para relatar a relação de Israel com a palavra de Deus. Demonstrando como Deus sempre cumpre sua palavra, ela oferece uma perspectiva de salvação ou maldição, dependendo da resposta do povo (Deuteronômio 7, 7-11; 2 Samuel 7, 1-17).
Por outro lado, a obra cronista reinterpretou essa visão histórica, renovando a fé nas promessas divinas e fortalecendo a esperança da comunidade pós-exílica (1 Crônicas 17, 14; 28, 9-10).
Conclusão
A esperança no Antigo Testamento e no Judaísmo pré-cristão é retratada como uma confiança profunda nas promessas e na fidelidade de Deus. Desde as alianças de Abraão até as reformas pós-exílicas, a esperança está intrinsecamente ligada à expectativa de bênçãos futuras e à restauração. Essa visão de esperança não apenas fortalece a fé, mas também orienta a conduta ética e comunitária do povo de Israel, refletindo a complexidade e a profundidade das tradições religiosas que moldaram a espiritualidade judaica.